Covid: mais de 80% dos profissionais da saúde relatam sofrer burnout na pandemia no Brasil
A maior parte dos profissionais de saúde da rede pública brasileira apresenta problemas de saúde e bem-estar mental na pandemia de Covid-19. A conclusão é de um estudo feito pela Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), publicado recentemente na revista científica Healthcare. As informações são da Agência Fapesp.
Em entrevista à Agência Fapesp, Tatiana de Oliveira Sato, professora do Departamento de Fisioterapia e do Programa de Pós-Graduação em Fisioterapia da UFSCar, diz que ainda não é possível afirmar que a pandemia é responsável pelos resultados encontrados.
“Mas acreditamos que o impacto especialmente pesado da Covid-19 no país contribuiu para índices tão ruins”, argumenta a professora.
Segundo ela, a sobrecarga no trabalho, as decisões difíceis e os dramas vivenciados nesse período afetaram os profissionais de saúde, especialmente os que atuaram na linha de frente.
Como a pesquisa foi realizada durante a pandemia, o questionário foi aplicado on-line e estava disponível para profissionais de saúde do Brasil inteiro. Os critérios de inclusão eram trabalhar no Sistema Único de Saúde (SUS), ter mais de 18 anos e estar envolvido diretamente com a assistência aos pacientes.
O formulário continha cinco questionários: o Copenhagen Psychosocial Questionnaire, que mensura os aspectos sociais e psicológicos; o Pittsburgh Sleep Quality Index, que avalia a qualidade do sono; o Nordic Musculoskeletal Questionnaire, responsável por avaliar problemas musculoesqueléticos; e o Beck Depression Inventory, que detecta sintomas depressivos. A coleta de dados foi realizada entre junho de 2021 e abril de 2022.
No total, 125 profissionais de saúde participaram do estudo. Os resultados mostraram que 86% sofrem com burnout e 81% com estresse. Sintomas depressivos leves foram encontrados em 22% dos profissionais de saúde. Outros 16% tinham sintomas depressivos moderados e 8%, severos. A maior parte (74,4%) também apresentou qualidade de sono ruim.
Quanto ao clima no trabalho, 75% avaliaram negativamente as demandas emocionais ligadas ao trabalho, 61% criticaram o ritmo do serviço e 47% reprovaram a imprevisibilidade. Esse são os fatores psicossociais com pior avaliação no artigo. Além disso, 15% dos profissionais relataram atenção sexual indesejada, o que engloba todo comportamento sexual que a pessoa não gostaria de receber; 26% sofreram ameaça, 9% de fato sofreram uma violência física e 17% reportaram bullying.
“Isso é lamentável. Todos esses números deveriam ser zero. Não é admissível encontrar esse tipo de problema em qualquer ambiente de trabalho”, disse Sato.
Por outro lado, mais de 90% dos participantes acreditam realizar um trabalho muito significativo e cerca de 80% se dizem comprometidos com o trabalho, mesmo diante de um clima tão estressante.
Esses resultados dizem apenas à primeira etapa do estudo. O projeto todo incluiu outros quatros momentos de avaliação: aos três, seis, nove e 12 meses após a primeira coleta. Os dados publicados até o momento se referem à primeira avaliação e ainda não contam com informações sobre a atividade física. Cerca de 60 participantes responderam todas as etapas.
Apesar do baixo número de respondentes, os autores acreditam que as descobertas são suficientes para pressionar as lideranças e as autoridades por melhorias nas condições de trabalho no SUS. Isso inclui mais contratações, melhores remunerações, jornadas menos exaustivas, treinamentos adequados e criação de redes de suporte.