SAÚDE

‘Depression room’: bagunça piora humor e pode ser sinal de crise na saúde mental; saiba como arrumar

O chão é praticamente invisível, pois há roupas espalhadas por todo lado. Quatro grandes cestos de plástico estão empilhados uns sobre os outros, alguns cheios de roupas, outros de eletrônicos. Há oito xícaras de café abandonadas na escrivaninha e na mesinha de cabeceira. No chão estão duas garrafas de água meio vazias, uma garrafa de tequila com um cacto de vidro dentro e um dispensador de ração para animais de estimação. Este é o “depression room” (“cômodo da depressão”, em tradução livre do inglês) de Abegael Milot, uma youtuber de 24 anos. Ela se propôs a arrumá-lo, e decidiu gravar o processo e compartilha-lo na plataforma de vídeos.

O termo é relativamente novo, e se popularizou por vídeos no TikTok e no YouTube que acumulam centenas de milhões de visualizações. Mas os especialistas há muito reconhecem a ligação entre bagunça e saúde mental. A desordem que pode se acumular quando as pessoas estão passando por uma crise de saúde mental não é uma forma de acumulação, nem o resultado de preguiça. O culpado é a fadiga extrema, afirma N. Brad Schmidt, diretor da Clínica de Ansiedade e Saúde Comportamental da Universidade Estadual da Flórida e professor de Psicologia na mesma instituição de ensino.

— As pessoas estão muitas vezes tão exaustas física e mentalmente que não sentem que têm energia para cuidar de si mesmas ou de seus arredores — disse Schmidt. — Elas simplesmente não têm a capacidade de se envolver com a limpeza e manutenção da casa como provavelmente já fizeram.

Uma casa bagunçada também pode contribuir para sentimentos de opressão, estresse e vergonha, fazendo você se sentir pior do que já se sente. E, embora a organização não cure sua depressão, ela pode melhorar seu humor. Se você está lutando e parece impossível manter seu ambiente organizado, aqui estão algumas dicas sobre como limpar estrategicamente para otimizar sua energia e seu espaço.

Foque na funcionalidade e não na estética

KC Davis, terapeuta e autora do livro ” How to Keep House While Drowning” (“Como manter a casa enquanto se afoga”, em tradução livre do inglês), conta que seu problema de desordem aumentou quando seu segundo filho nasceu no início de 2020. Ela afirma que sempre foi “bagunceira”, mas que sua bagunça era funcional. De repente, confrontada com um novo bebê, depressão pós-parto e uma pandemia, Davis percebeu que estava perdida por não ter nenhum sistema de organização.

Enquanto trabalhava para organizar sua casa, Davis começou a postar vídeos de seu progresso no TikTok, onde agora tem 1,5 milhão de seguidores. Em meio a uma grande quantidade de conteúdo sobre autoajuda e limpeza, ela optou por uma abordagem mais gentil e pragmática. Suas dicas são realistas sobre suas capacidades e se concentram em ter um espaço habitável, não impecável.

Uma de suas estratégias mais populares é “arrumar cinco coisas”, a ideia de que há apenas cinco coisas em qualquer cômodo: lixo, pratos, roupas, coisas com lugar e coisas sem lugar. Concentrar-se em uma categoria por vez evita que ela fique sobrecarregada quando parece que há uma centena de itens diferentes que precisam ser guardados.

Davis também é uma grande defensora do que ela chama de “deveres de fechamento”, inspirada no tempo em que trabalhava como garçonete. Muitas vezes ela não tinha energia para limpar toda a cozinha todas as noites, então começou a fazer apenas algumas pequenas tarefas, “como uma gentileza para o futuro, para me preparar para ter sucesso na manhã seguinte”.

— Afastei-me dessa ideia de que tinha que ser tudo ou nada e comecei a pensar apenas no que era útil quando se tratava de limpeza — disse ela. — Quando penso em “Do que vou precisar amanhã de manhã?” de repente, posso ser específica.

Ela, por exemplo, se certifica de ter pratos limpos e espaço suficiente no balcão para preparar o café da manhã, esvaziar o lixo e varrer as migalhas.

— O que parece uma tarefa grande e interminável é, na verdade, apenas 20 minutos do meu dia — conclui.

Para as pessoas que estão realmente lutando contra problemas de saúde mental, Davis enfatiza que as coisas podem ser feias, mas não devem ser anti-higiênicas, porque todos “merecem estar limpos e confortáveis”. Se você não tem energia para lavar todos os pratos, limpe apenas um ou dois para a próxima refeição ou use pratos de papel. Se a roupa envolver muitas etapas, não se preocupe em dobrá-las: uma amarrotado nunca fez mal a ninguém.

Faça sua casa trabalhar melhor para você

As pessoas que são neurodivergentes, com transtorno de déficit de atenção e hiperatividade (TDAH), autismo ou outros problemas de funcionamento executivo, também costumam lutar contra o excesso de desordem. Assim como “depression room”, o termo “doom piles” (“pilhas de perdição”, na tradução livre do inglês) tornou-se popular nas mídias sociais para descrever as coisas aleatórias que se acumulam e você não sabe o que fazer com elas. Quase todo mundo tem uma ou duas gavetas cheias dessas coisas em casa, mas essas pilhas de desordem tendem a ser mais onipresentes para pessoas que têm dificuldade com o funcionamento executivo.

Lenore Brooks é uma designer de interiores especializada em trabalhar com pessoas neurodivergentes. Quando sua irmã, que tem TDAH, morou com ela por um breve período, a profissional descobriu que havia muitos recursos para ajudar crianças com TDAH ou autismo a se organizarem, mas praticamente nenhum voltado para adultos.

Grande parte do trabalho de Brooks gira em torno de ajudar seus clientes a lidar com a desordem aparentemente interminável: eles sentem que estão constantemente limpando, mas a bagunça está sempre lá. As pessoas com TDAH lutam especialmente com isso porque, “é quase como uma fadiga de decisão o tempo todo. ‘Não consigo decidir o que fazer com isso, então simplesmente não vou fazer nada’”, explica.

O primeiro passo, disse Brooks, é realmente prestar atenção aos itens que você costuma limpar. Em seguida, encontrar os melhores lugares para eles ficarem.

— Falo muito com meus clientes sobre sistemas. Descobrir por que as coisas estão onde estão, por que a desordem está se acumulando onde está e, em seguida, mudar o design ou a organização em torno de como as pessoas estão realmente usando sua casa — detalha.

Essas mudanças podem ser simples. Por exemplo, se você estiver constantemente removendo canetas das almofadas do sofá da sala e da mesa de centro, pense em destinar um local para manter as canetas na sala onde você as está realmente usando. Para uma cliente cujo escritório em casa estava sempre cheio de pratos sujos, Brooks deu a ela uma bandeja na qual poderia carregar sua parafernália de chá e lanche e voltar para a cozinha no final de cada dia.

Pare o problema antes que comece

Uma vez que seu espaço esteja limpo e relativamente organizado, tente dedicar alguns minutos todos os dias para mantê-lo assim. Davis recomenda cronometrar cinco ou 10 minutos e destinar esse tempo a cuidar o máximo da casa.

— Eu digo a mim mesma, não preciso terminar esta tarefa, mas vou me levantar por oito minutos e fazê-la. Normalmente fico surpresa com o quanto consigo fazer.

E lembre-se, é normal ter alguma desordem em sua casa. O controle remoto da TV, seus óculos, a correspondência que você precisa separar, um projeto de arte no qual está trabalhando:

— Eles são os sinais de vida em sua casa — finaliza Brooks.

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