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Brasil deixa aliança antiaborto patrocinada por países ultraconservadores

governo recém-empossado do presidente Lula (PT) anunciou nesta terça-feira (17) que se retirou da chamada Declaração do Consenso de Genebra, espécie de libelo multilateral contra o aborto e em defesa da família baseada em casais heterossexuais.

A justificativa, expressa em nota conjunta das pastas de Relações Exteriores, Mulheres, Direitos Humanos e Cidadania e Saúde, é de que o texto “contém entendimento limitativo dos direitos sexuais e reprodutivos e do conceito de família e pode comprometer a plena implementação da lei nacional sobre a matéria”.

O Brasil havia aderido ao documento em outubro de 2020, numa cerimônia na qual o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) foi representado pelos então ministros Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Damares Alves (Mulher, Família e Direitos Humanos), expoentes da chamada ala ideológica da gestão.

A declaração defende que “a família é a unidade natural e fundamental da sociedade”, em que a mulher “desempenha um papel crítico” e que “o aborto jamais deve ser usado para fins de planejamento familiar”.

Ministra das Mulheres, Cida Gonçalves afirmou que a saída do consenso representa “uma mudança radical” no campo das políticas que visam a população feminina. Já Silvio Almeida, dos Direitos Humanos, pontuou que a decisão representa uma aproximação do Brasil com entidades que “de fato […] têm uma tradição na criação de um ambiente político em que o diálogo e o respeito às minorias seja a tônica”.

Os EUA, à época comandado por Donald Trump, foram um dos patrocinadores da declaração, em 2020. Na posse de Joe Biden, porém, já haviam deixado de referendar o texto e de representar sua liderança.

Após a saída do Brasil, teriam restado apenas três signatários latino-americanos no documento: Haiti, Guatemala e Paraguai —a última versão oficial do documento é de outubro de 2021. Trata-se de uma consequência da nova “onda rosa” na região após a eleição de vários líderes de esquerda e de centro-esquerda. Em agosto passado, Gustavo Petro, presidente da Colômbia então recém-empossado, deixou o acordo assinado por seu antecessor direitista Iván Duque meses antes.

A decisão do Brasil ocorre um dia após o Ministério da Saúde revogar seis portarias da gestão Bolsonaro. Uma delas previa a necessidade de que o médico avisasse a polícia em caso de aborto por estupro.

Ainda nesta terça, o governo federal também comunicou à Cepal (Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe) a intenção de se associar a duas outras declarações que tratam da questão de gênero.

São elas o Compromisso de Santiago e a Declaração do Panamá, que analisam o tema sob a perspectiva dos impactos da Covid e da desigualdade social, respectivamente —ao contrário da Declaração do Consenso de Genebra, elas estariam “plenamente alinhadas com a legislação brasileira”.

Segundo a gestão petista, a associação aumentaria o potencial para cooperação multilateral sobre direitos das mulheres nos âmbitos regionais e do hemisfério.

SIGNATÁRIOS DA DECLARAÇÃO DO CONSENSO DE GENEBRA*

  1. Bahrein
  2. Belarus
  3. Benin
  4. Burkina Fasso
  5. Camarões
  6. República Democrática do Congo
  7. Congo
  8. Djibuti
  9. Egito
  10. Gâmbia
  11. Geórgia
  12. Guatemala
  13. Haiti
  14. Hungria
  15. Indonésia
  16. Iraque
  17. Quênia
  18. Kuait
  19. Líbia
  20. Nauru
  21. Níger
  22. Omã
  23. Paquistão
  24. Paraguai
  25. Polônia
  26. Qatar
  27. Rússia
  28. Arábia Saudita
  29. Senegal
  30. Suazilândia
  31. Sudão do Sul
  32. Sudão
  33. Uganda
  34. Emirados Árabes Unidos
  35. Zâmbia

*Segundo última versão oficial do documento, de 22 de outubro de 2021

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