Lula planeja ir ao Supremo para derrubar regra da privatização da Eletrobras
A Casa Civil e a Advocacia-Geral da União (AGU) de Lula planejam uma ofensiva jurídica para modificar o estatuto da Eletrobras e garantir mais poder ao governo na companhia. Os técnicos dos dois ministérios trabalham na elaboração de uma ação direta de inconstitucionalidade (ADI) a ser apresentada para o Supremo Tribunal Federal (STF) para modificar a regra do estatuto da Eletrobras.
O objetivo da ação, encomenda do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é derrubar o dispositivo que estabelece que qualquer acionista tem no máximo 10% do poder de voto nas assembleias, mesmo que tenha participação maior na empresa. Isso inclui a União, que tem 42,6% das ações.
O próprio Lula afirmou nesta terça-feira, em entrevista transmitida on-line pelo site 247, que “o governo vai voltar a ser dono da Eletrobras”. O presidente disse ainda na entrevista que a privatização foi “um crime”.
Na ação que avalia apresentar ao Supremo, o governo pretende argumentar que esse limite de 10% é inconstitucional.
O limite foi estabelecido na lei da privatização da Eletrobras, aprovada no Congresso, e incluído no estatuto da companhia — privatizada em junho de 2022, em uma negociação pela qual investidores pagaram R$ 33,7 bilhões.
Ao longo das negociações para a privatização, ficou claro que transformar a companhia numa “corporation” – ou seja, que não tem um controlador definido — seria uma das condições para atrair investidores e fazer o negócio deslanchar.
Outra foi a inclusão, no estatuto, de uma proteção contra a reestatização via “poison pill”, a pílula de veneno, no jargão do mercado. Por esse instrumento, caso queira reestatizar a empresa, o governo precisa pagar o triplo do valor das ações.
Quando a lei da privatização era discutida no Tribunal de Contas da União, Lula chegou a telefonar para dois ministros da Corte para dizer que, se fosse eleito, reverteria o negócio.
Durante a campanha eleitoral, o então candidato criticou a privatização e, na transição, o grupo de trabalho de Minas e Energia estudou formas de reverter o negócio.
Mas a constatação de que recomprar a empresa seria caro demais fez o governo se concentrar no teto para o exercício do poder de voto.
Só que, como esse dispositivo foi criado por uma lei no Congresso, a única forma de derrubá-lo seria aprovar outra lei ou recorrer ao Supremo.
A solução via STF, no entanto, deve esbarrar em alguns empecilhos. Um deles é o risco de o processo parar nas mãos do ministro Kassio Nunes Marques, que já é relator de uma série de ações que contestam a venda da estatal após a aprovação da medida pelo Congresso e a sanção por Jair Bolsonaro.
Se o STF decidir que todas as ações sobre o assunto vão para Nunes Marques, por prevenção, o governo deve encontrar resistência.
Isso porque os movimentos do ministro até agora foram favoráveis à privatização — como, por exemplo, o de simplesmente não dar nenhuma liminar para parar o processo. Fora isso, Nunes Marques pediu informações e deu andamento burocrático aos pedidos, mas não colocou nenhum obstáculo à privatização.
Kassio é considerado, dentro e fora do STF, o magistrado mais alinhado aos interesses de Jair Bolsonaro, que o nomeou para o tribunal.
Para complicar a vida do governo Lula, dois ministros vistos como mais alinhados à agenda esquerdista na economia – Rosa Weber e Ricardo Lewandowski – estão de fora da distribuição de processos desse tipo.
Rosa, que é presidente da Corte, não recebe ações dessa natureza durante o período em que comanda o tribunal. E Lewandowski, por estar próximo de sua aposentadoria, já está excluído da distribuição diária dos novos processos que chegam ao STF.
Por isso, um plano B para o governo poderia ser entrar com uma ação civil pública na Justiça Federal, buscando uma solução na primeira instância.
Não é, porém, um plano muito promissor, já que o risco de uma decisão pró-governo ser alvo de recursos ter que voltar para o STF é grande.