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‘Uma criança de 9 anos matou a minha filha?’, pai de cigana Hyara que acusa viúvo do crime critica conclusão de inquérito pela polícia

‘Eu e minha família estamos indignados e revoltados’. Assim reagiu, na última sexta-feira, o cigano Hyago Alves, pai da adolescente Hyara Flor, de apenas 14 anos, que morreu após ter sido baleada na cabeça, na casa onde morava, em Guarantinga, na Bahia. Os parentes da menina contestam veementemente o desfecho do inquérito policial, que concluiu, após reviravolta, que a cigana não foi morta por vingança ou motivação passional, mas sim vítima de um disparo acidental, feito pelo cunhado de 9 anos, enquanto os dois brincavam com a pistola que pertencia à sogra dela. Em sua declaração, Hyago diz que testemunhas foram manipuladas e faz críticas diretas à condução do caso pelo delegado (Robson Domingos, titular da Delegacia Territorial de Guaratinga). Acrescenta ainda que o inquérito teria sido concluído antes do resultado da perícia. As afirmações são rechaçadas pelos investigadores, que detalharam como solucionaram o crime.

 

– Estou indignado e revoltado. Mas eu já esperava essa atitude do delegado nesse inquérito policial. Desde o início eu venho batendo nessa tecla. Ouviram três pessoas manipuladas, que tiveram tempo suficiente para manipular (as versões) porque estavam soltos o tempo todo, foragidos da polícia, e que correram sem prestar socorro para a minha filha – disse Hyago. – Ouvir três pessoas manipuladas e afirmar que foi uma criança de 9 anos que matou minha filha? O que a perícia não indicou ainda, o senhor (referindo-se ao delegado) já afirmou com suas palavras. Eu e minha família estamos muito tristes e revoltados com isso. São 40 dias sofrendo e temos uma resposta dessa no inquérito policial. Mas confiamos muito na Justiça e no promotor de Justiça. Acima do senhor (referindo-se mais uma vez ao delegado) tem o Ministério Público e tem Deus – concluiu.

 

Segundo a Polícia Civil, a conclusão do inquérito só foi possível graças a elementos periciais e relatos de testemunhas-chave. Laudo de necropsia, perícia no local e até uma imagem flagrada por câmera de segurança logo após a morte de Hyara naquele dia 9 de julho não apenas foram levados em consideração nos autos, como foram determinantes para o desfecho surpreendente.

A perícia analisou a posição e o ângulo do tiro da pistola calibre .380 que atingiu Hyara Flor naquele dia e concluiu que eram incompatíveis com a altura de cerca de 1,80m do até então principal suspeito pelo crime, o marido de 14 anos. O disparo foi feito de perto, de uma distância de no máximo 25 centímetros. Essa constatação já praticamente o descartava da lista de suspeitos.

‘Eu matei Hyara!’: criança é vista desesperada logo após suposto disparo

 

 

As imagens de uma câmera de segurança, então, foram determinantes para que a investigação começasse a caminhar na direção do que já alegava o pai do principal suspeito e sogro de Hyara. “Meu filho estava brincando e fez um disparo acidental”, disse em publicação nas redes. De acordo com a polícia, a gravação mostra o menino de 9 anos, cunhado da vítima, logo após ter feito o suposto disparo acidental, correndo em direção à rua. Ele coloca as mãos à cabeça e grita: “Me matem, eu matei a Hyara!”. Neste momento, os investigadores contam que os parentes se desesperam e entram correndo na casa onde a cigana morava com o marido.

É depois desse momento que a polícia afirma que um tio de Hyara, irmão de Hyago, após ouvir o disparo e a movimentação na casa, começa a disparar tiros em direção a eles. Ele inclusive acabou indiciado no inquérito pela conduta hostil. Depois dos tiros e de supostas ameaças, a família do marido resolve, então, pegar o carro às pressas e fugir dali.

Carro não estava preparado para longa viagem

 

Os policiais descartaram a hipótese de que a família do garoto tenha premeditado o crime porque, no momento da fuga, o carro deles estava com o tanque vazio e precisou ser reabastecido no caminho para o Espírito Santo, estado onde buscaram abrigo em outra comunidade cigana.

A investigação também apurou que a arma foi comprada pela mãe do marido de Hyara em Vitória da Conquista após uma tentativa de sequestro que o filho sofreu em Guaratinga.

Pesaram ainda a favor do adolescente o fato de o laudo de necropsia não indicar sinais internos ou externos de violência doméstica e, sobretudo, o relato das 16 testemunhas – incluindo menores de idade, acompanhados por promotores do Ministério Público da Bahia –, que de forma unânime afirmaram que os dois, casados há apenas 45 dias, tinham uma relação harmônica.

A família de Hyara sustentava ainda a hipótese de que o crime tivesse sido cometido por vingança após um relacionamento extraconjugal entre a mãe do adolescente e o tio da vítima. No entanto, de acordo com a polícia, esta versão não se sustentou com provas.

Sogra e tio indiciados

 

A sogra de Hyara Flor foi indiciada por homicídio culposo e porte ilegal de arma de fogo, considerando que a pistola utilizada no crime pertencia a ela. O tio da vítima foi indiciado por disparo de arma de fogo, referente a tiros deflagrados contra a residência do casal de adolescentes. O adolescente, ex-companheiro da vítima, foi ouvido por meio de videoconferência pela juíza da comarca de Guaratinga após a conclusão do inquérito e foi solto.

Em nota oficial, a Polícia Civil afirma que a investigação do caso concluiu que o tiro que atingiu a vítima foi deflagrado pelo cunhado da adolescente, de nove anos, quando a criança e Hyara brincavam com a arma no quarto dela. “No curso das apurações foram analisados laudos periciais, oitivas de 16 pessoas, entre elas, duas crianças que prestaram depoimento especial com a presença de promotor de Justiça da Promotoria da Infância e da Juventude do Ministério Público da Bahia. Também foram analisadas imagens de câmera de vigilância do endereço do fato, documentos e mensagens de celular e redes sociais, além de apurações em campo”.

A reportagem procurou novamente a polícia, nesta quarta-feira, pedindo um posicionamento sobre as críticas feitas pelo pai de Hyara, mas a instituição afirmou apenas que todas as informações já foram fornecidas sobre o caso e que a parte da Polícia Civil já foi finalizada, já que o inquérito já foi concluído e remetido. O delegado Robson Domingos não quis dar entrevista. O Ministério Público da Bahia, por sua vez, ainda não informou se apresentará denúncia à Justiça após o recebimento do inquérito.

Procurada, a defesa de Hyago Alves não retornou o contato. A reportagem também não conseguiu contato com Homero Mafra, advogado responsável pela defesa da família do ex-marido de Hyara.

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