Região Metropolitana do Rio tem safra temporã e se prepara para super colheita da “laranja mais doce do país”
Os mais de 800 citricultores de Tanguá, Rio Bonito, Araruama e Itaboraí, estão eufóricos: iniciaram a primeira grande colheita da safra local, estimada em mais de 18.200 toneladas, com o título de Indicação Geográfica, no modelo Denominação de Origem (IG-DO), de laranja mais doce do Brasil. Ou seja, nenhuma outra no país é mais doce que a da Região Metropolitana do Rio, que já ostenta o título de Capital Estadual da Laranja, consagrado pela Lei 9.608/22, sancionada pelo governador Cláudio Castro.
A laranja da região é a primeira fruta do Estado do Rio a obter o selo, concedido pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). A conquista é fruto de um processo que durou dois anos, com participação do Governo do Estado do Rio, por meio das empresas de Assistência Técnica e Extensão Rural (Emater-Rio) e de Pesquisa Agropecuária (Pesagro).
A Indicação Geográfica – equivalente à 100ª IG concedida pelo INPI, em julho do ano passado – comprova a qualidade diferenciada do produto fluminense. De acordo com os donos dos pomares, o selo já está abrindo portas para os mercados nacional e fortalecendo a economia regional, assim como o turismo rural. A revitalização do Circuito da Laranja, criado em 2010 pela Prefeitura de Tanguá, e a implementação de outros roteiros rurais, em fase de testes, são apostas.
Com apoio da Associação dos Citricultores e Produtores Rurais de Tanguá (Acipta), as famílias que sobrevivem da laranja planejam expandir seus negócios; comprar mais equipamentos e caminhões; construir uma fábrica de sucos de laranja e investir futuramente na exportação das quatro espécies que produzem: Seleta, Natal, Folha Murcha e Natal Comum, ingredientes também para alavancar o turismo rural.
Cláudio Castro enalteceu a importância da parceria dos citricultores com os agrônomos, lembrando que até então o único produto do agronegócio reconhecido pelo INPI era a cachaça de Paraty.
– Parabenizo os citricultores e os técnicos da Emater e da Pesagro. Juntos com pesquisadores da Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), enfrentaram um longo processo, desde novembro de 2020, para a obtenção desse registro tão importante. Foram muitas etapas até o reconhecimento definitivo dos fatores humanos e naturais que interferem diretamente nas características positivas da laranja produzida na Região Metropolitana – justificou.
A constatação de fatores naturais, que resultam numa laranja com características especiais, foi comprovada por estudos com o uso de ferramentas de geoprocessamento do Sistema de Informação Geográfica (SIG). Além do clima propício – no período de desenvolvimento dos frutos há abundância de água e na fase de maturação há deficiência hídrica, gerando a elevada doçura -, a utilização de um único tipo de porta enxerto, a escolha por áreas arenosas para plantios, o baixo uso de máquina agrícolas, castigando menos o solo, o reduzido uso de agrotóxicos, as lavouras consorciadas, a boa cobertura vegetal, a adubação orgânica e o uso de abelhas na polinização das flores do laranjal, contribuem para a formação da “super laranja”.
Menos acidez, mais doçura
De acordo com o “Laudo de Limitação da Área Geográfica da Denominação de Origem Região de Tanguá para Laranjas”, emitido pela Secretaria estadual de Agricultura, Pecuária e Abastecimento (SEAPA), o principal diferencial da laranja de Tanguá é a doçura elevada. As laranjas consideradas doces têm de 10 a 12 brix (escala para aferir a doçura de frutas). As da Região de Tanguá têm de 14 a 16 Brix.
A presidente da Associação de Citricultores de Tanguá, Alessandra Bellas, explica que, conforme estudos, além do grau elevado de Brix, as propriedades do solo regional, íngreme e rico em fósforo e potássio, nutrientes importantes para o desenvolvimento dos laranjais, influem na baixa acidez da fruta.
– Com acidez até 50% menor, conforme estudos, a sensação de doçura aumenta ainda mais – explica Alessandra.
O técnico da Emater, Herval Lopes, atesta que um conjunto de fatores transforma a laranja daquela região em uma espécie de “super fruto”.
– Contam nesse conjunto de fatores, a qualidade do solo, o relevo íngreme, o clima, com calor que predomina na maior parte do ano, e especialmente, a maneira diferenciada de cultivo, com baixo uso de defensivos agrícolas e o controle de pragas – destaca Herval.
As técnicas usadas pelos agricultores, com orientações da Emater, Pesagro e também da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa), têm feito com que os produtores da Região de Tanguá, onde 15% da população está ligada aos laranjais, produzam a fruta na maior parte do ano. Este mês, por exemplo, eles estão colhendo uma safra temporã.
De olho no mercado internacional
Por dia, na região de Tanguá, são colhidas cerca de 1.000 caixas de laranjas. O produto tem fácil vazão no Ceasa, feiras livres e merenda escola. O fato de as localidades produtivas estarem próximas ao segundo maior mercado consumidor brasileiro anima os agricultores.
Mônica Bicudo, uma das agricultoras conta que a Indicação Geográfica foi ventilada em 2004.
– De lá para cá nos unimos para essa conquista, retomada com vigor a partir de 2017 e agora concretizada de verdade – conta Mônica, que ajudou a recuperar rios, reflorestar matas e instituir a agricultura orgânica, sem agrotóxico.
A engenheira agrônoma Diana Franco de Sá, que atua como Agente Local de Inovação Para o Campo, pelo Sebrae, faz parte da parceria com os citricultores.
– Para alcançar os padrões de excelência exigidos pelo INPI, que conferem qualidade ímpar à laranja daqui, é preciso muita disciplina, dedicação e união – elogia Diana.
Produtores otimistas com desenvolvimento do setor
Claudionor Cardoso da Rocha, de 68 anos, conta com entusiasmo que a Indicação Geográfica da laranja que produz no sítio da família é uma espécie de troféu para ele, seus familiares e vizinhos, que sobrevivem dos pomares de laranjas.
– É uma alegria para nós. No meu caso, estou nessa labuta desde os 8 anos de idade, quando passei a trabalhar no campo com meu pai, Nicanor, que morreu em 2012 – ressalta Claudionor, que construiu até um mine museu em casa, que conta a trajetória dos agricultores.
Para Delso Capistrano Gomes, de 65 anos, o sentimento de novo divisor de águas com a obtenção do selo do INPI é o mesmo de Claudionor.
– Agora teremos novas conquistas à frente. A Indicação Geográfica está agregando ainda mais valor ao nosso produto – destaca Delso, que, com a esposa, Ana Lúcia, 60, e um funcionários, colhe 2 mil caixas de laranja Seleta anualmente.