Betty Faria: ‘Não vou ficar me lamentando e debatendo etarismo; Não estou no ostracismo porque envelheci’
Betty Faria transita no imaginário de muitos segmentos. E por vários motivos. Entre mulheres, é ícone do libertarismo setentista, quando, ao lado de Sônia Braga, Leila Diniz e Vera Fischer, provocou uma revolução na teledramaturgia brasileira. Para os homens, figura no ranking das eternas sex symbols, sendo capa da Playboy três vezes. Da última ocasião em que exibiu-se sem roupa, no pleno sucesso da novela “Tieta” (1989), brilhou na edição mexicana da revista. Já na comunidade LGBTQIA+, Betty é musa inspiradora de uma gíria que ilustra o desejo por outra pessoa. “Ah, Betty Faria…”, brincam — lembrando que o verbo “fazer”, no caso, significa ficar com alguém.
A atriz acha muito curioso todo esse movimento criado ao seu redor.
— Sempre tive muitos amigos gays. São leais e carinhosos. Mas nunca me senti uma sex symbol, como descrevem. Eu simplesmente atuava. O corpo é o instrumento de trabalho de qualquer ator ou atriz. E sempre busquei me cuidar. Mas, óbvio que, agora, aos 80 anos (a atriz fez 82 anos em maio), não vou colocar a minha bunda de fora — brinca Betty, que, devido a uma certa patrulha ideológica, anda receosa em expor opiniões publicamente e a conceder entrevistas. — Estou aqui falando com vocês, mas com medo. Tudo o que a gente diz se volta contra nós, artistas, de forma violenta. Éramos amados. Há algo perdido que precisamos resgatar.
Apesar das queixas, a atriz segue muito requisitada. Nos últimos meses, Betty esteve envolvida em quatro produções a serem lançadas ainda neste ano: a série “Codex 632”, inspirada no best-seller do jornalista José Rodrigues dos Santos, gravada em Portugal numa parceria da emissora RTP com o Globoplay; o filme “Enterre seus mortos”, baseado no livro de Ana Paula Maia, com direção de Marco Dutra; o longa “Justa”, da diretora portuguesa Teresa Villaverde, além da série “Suíte Magnólia”, estreia de Hamilton Vaz Pereira no audiovisual, para o Canal Brasil.
Foi isso que levou ao convite para a campanha publicitária de um site de apostas esportivas ao lado do cantor Beto Jamaica, do ex-jogador Bebeto e do influencer Antonio Tabet — em comum entre todos, ter no nome a sílaba “bet” (“aposta” em inglês). Fez sucesso. Betty ganhou o carinho nas redes sociais junto a um novo segmento e a sua imagem divulgada em pontos de ônibus, outdoors e banners por todo o país.
No entanto, se há mãos que afagam atriz, outras a apedrejam com virulência. Vale tudo: as críticas surgem quando aparece de biquíni na praia, quando circula pelas ruas do Leblon com sacolas de supermercado, quando lança comentários no Twitter (seu canal predileto para interagir com os fãs).
Betty busca se acostumar a uma sociedade que hipervaloriza o efêmero e a juventude, deslegitimando memórias, trajetórias e mulheres que envelhecem.
— Querem que eu fique me lamentando e debatendo o etarismo? Não vou fazer isso — avisa a atriz. — Desculpem-me frustrá-los. Sou uma trabalhadora que não se deixa abater pelas expectativas criadas no mercado. Não estou no ostracismo por ter envelhecido.
Liberdade é tudo
Betty não tem previsão de volta às novelas. Mas estão disponíveis no Globoplay alguns dos sucessos de que foi protagonista, como “Pecado capital” (1975), “Partido alto” (1984) e “Tieta”. Não por acaso, são os folhetins que motivaram os editores da Playboy a convocá-la para os famosos ensaios nas capas da revista — que até hoje colocam colecionadores em pé de guerra nos sebos virtuais.
— Não sou nostálgica. Vivi o auge da revolução feminista tendo “O segundo sexo”, da Simone de Beauvoir, como bíblia. Casei, descasei. E, no fim, descobri que nunca fui uma mulher vocacionada para o casamento — analisa Betty. — Eu gosto da liberdade. Talvez por isso não me sinta também com vocação para o teatro. Fico louca quando penso que tenho de sair de casa à tarde num fim de semana ensolarado para me preparar e subir ao palco à noite. Não sinto no teatro o mesmo prazer quando estou no set de filmagem de uma novela ou de um longa, onde não tenho a sensação de aprisionamento.