Exposição Livros de Artista na Coleção Itaú Cultural abre no Museu de Arte do Rio – MAR com peças recém adquiridas
As 55 obras do acervo do IC se juntam a outras 79 do MAR, traçando diálogos e preenchendo lacunas entre si. A primeira coleção se concentra nos artistas brasileiros, na transição entre o moderno e o contemporâneo. A segunda tem foco tanto em artistas internacionais, quanto em produções brasileiras recentes com interesses em recortes de racialidade, ancestralidade, gênero e território.
Narrativas em Processo: Livros de Artista na Coleção Itaú Cultural, também disponível virtualmente em livrosdeartista.itaucultural.org.br, chega ao Rio de Janeiro, sétima cidade de sua itinerância pelo Brasil, com cinco novas peças, recém-adquiridas. Em cartaz de 28 de outubro de 2023 e 21 de janeiro de 2024, no Museu de Arte do Rio – MAR, a mostra percorre mais de 80 anos desse tipo de produção no cenário brasileiro, sendo também composta por obras da instituição carioca. Assim, somando 134 itens de 99 artistas, uma coleção alimenta-se da outra, preenchendo vazios e formando uma rede robusta, em um diálogo entre acervos.
Felipe Scovino assina a curadoria da Coleção Itaú Cultural, concentrada nos artistas brasileiros, particularmente na transição entre o moderno e o contemporâneo. Entre as novidades estão Aberto pela aduana, de Eustáquio Neves, projeto selecionado pelo Rumos Itaú Cultural 2019-2020; Anotações Visuais, de Dalton Paula; Búfala e Senhora das Plantas, de Rosana Paulino; …Umas, de Lenora de Barros; e Reprodutor, de Rochelle Costi.
Por sua vez, com curadoria de Júlio Martins a coleção de livros de artista do MAR se foca em produções brasileiras recentes com interesses em recortes de racialidade, ancestralidade, gênero e território, além de apresentar caráter internacional. Há, por exemplo, revistas editadas pelo coletivo feminista Guerrilla Girls, que reescreve a história da arte nesse suporte acessível e direto.
As 55 obras do Itaú Cultural estão distribuídas em cinco eixos: Rasuras, Paisagens, Álbuns de Gravura, Uma Escrita em Branco e Livros-objetos. As do MAR somam 72 agrupadas em três: Outros começos, Livro de carne e No vazio do mundo. Entenda cada um deles abaixo.
A exposição contará com programação paralela composta por duas mesas de debates: uma no dia 30 de novembro, com participação da artista Rosângela Rennó, e outra no dia 19 de dezembro, com Yhuri Cruz, também artista integrante da mostra. A curadoria das duas instituições também estará presente nos bate-papos sobre a produção artística e as obras de ambos os artistas.
COLEÇÃO ITAÚ CULTURAL
Rasuras
Neste núcleo estão peças que se colocam à margem de uma narrativa obediente ao pragmatismo. É o lugar de uma escrita que nasce para não ser compreendida, que é oferecida ao mundo com certo grau de violência e gestualidade, a exemplo de Em Balada (1995), de Nuno Ramos, cujo rastro do projétil atravessa o volume e se transforma em signo de leitura.
Os livros de Adriana Varejão, Artur Barrio e Fernanda Gomes, que compõem parcialmente a série As Potências do Orgânico (1994/95), e o livro de Tunga são índices de corpos transmutados em livros – estão lá vísceras, sangramentos, machucados, e no caso de Tunga, um componente erotizante.
Lais Myrrha também pode ser vista com o Dossiê Cruzeiro do Sul (2017), que questiona politicamente a constelação do Cruzeiro do Sul invertida na bandeira do Brasil; Aline Motta, com Escravos de Jó (2016), sobre um Brasil necropolítico, e Rosângela Rennó, com 2005-510117385-5 (2009), criada com reproduções de fotos furtadas e posteriormente encontradas e devolvidas à Biblioteca Nacional, seu lugar de origem.
Paisagens
Aqui, os livros de artistas podem problematizar a paisagem enquanto um labirinto sensorial, como é a obra de Jorge Macchi, a paisagem como uma partitura que logo se transforma em desenho, como em Montez Magno e Sandra Cinto, evidenciar uma ampla gama de paisagens sociais atreladas a questões fundamentais para a compreensão do Brasil enquanto sociedade plural, como são os casos de Dalton Paula, Lenora Barros, Rosana Paulino e Eustáquio Neves.
Ainda, evidenciar a relação entre cosmogonias e povos originários, no caso de Menegildo Paulino Kaxinawa. Além disso, há uma produção realizada nos últimos cinco anos que se volta com uma potência crítico-social sobre a paisagem política brasileira, como pode ser observado na atmosfera de cinismo e niilismo que ronda o Livro de colorir, de Marilá Dardot, e O Ano da Mentira, de Matheus Rocha Pitta.
Álbuns de gravura
Este núcleo apresenta álbuns em tiragem limitada, contendo obras de artistas plásticos que tiveram atuação determinante na passagem do moderno ao contemporâneo no Brasil. Concentra distintas análises, que exploram a reflexão sobre o diálogo entre a produção artística e os meios de experimentação, tendo o livro como forma e a serialidade como meio.
Nas obras de Arthur Luiz Piza, Edith Behring e Sérvulo Esmeraldo percebe-se como a linguagem abstrata é múltipla no país, com contribuições e visões mais distintas do que próximas dos concretos e neoconcretos. Carlos Scliar, Glauco Rodrigues e Glênio Bianchetti, que fundaram o icônico Grupo de Bagé, estão presentes por meio de Gravuras Gaúchas (1952).
O Meu e o Seu (1967), de Antonio Henrique Amaral, e Lito 70 (1969), de João Câmara e Gastão de Holanda, têm a violência, o sexo e a política como temas recorrentes, com aparições de bocas, seios e armas, no primeiro caso, e de um nu tendendo ao expressionismo, no segundo.
De Regina Silveira tem Anamorfas (1980), uma subversão dos sistemas de perspectiva. A mostra também conta com espaço para a xilogravura: Pequena Bíblia de Raimundo Oliveira (1966), com texto de Jorge Amado, e Das Baleias (1973), de Calasans Neto, acompanhado de um poema de Vinicius de Moraes. A literatura de cordel é o referente para essas obras. Na exposição, o cordel não se apresenta apenas uma expressão da cultura brasileira, mas como um livro e uma narrativa produzidos manualmente pelo próprio artista.
Uma escrita em branco
Os visitantes encontram neste espaço livros que evidenciam a forma, o peso e a estrutura da obra ao invés da palavra, como Brígida Baltar, com Devaneios/Utopias (2005), Débora Bolsoni, com Blocado: A Arte de Projetar (2016), e Waltercio Caldas, com Momento de Fronteira (1999) e Estudos sobre a Vontade (2000).
Já O Livro Velázquez (1996) e Como Imprimir Sombras, ambos de Caldas, e Caixa de Retratos (2010), de Marcelo Silveira, o leitor é deixado em um estado de perda de referências, pois a linguagem impressa no livro é turva, não se exibe com exatidão.
Livros-objetos
Esse núcleo reúne e homenageia os pioneiros no Brasil dos chamados livros-objetos e sua intersecção direta com a poesia concreta. São três livros feitos em parceria entre Augusto de Campos e Júlio Plaza: Caixa Preta (1975), Muda Luz (1970) e Objetos (1969).
RECORTES DA COLEÇÃO – ACERVO MAR
Outros começos
Ainda que uma historiografia da arte hegemônica descubra em Edward Ruscha, que está na mostra com a obra Every Building on Sunset Strip (1966), uma origem do livro de artista, interessa mais a este núcleo contar uma outra história, que se revela em vários começos locais. Indica marcos importantes e releituras possíveis para uma história do livro de artista, que compreenda as especificidades e pluralidade dos formatos editoriais, especialmente no Brasil.
Na exposição, as práticas museológicas de Marcel Broodthaers nos anos 1960, por exemplo, dialogam com as edições de Regina Melim nos anos 2000, concebidas como projetos curatoriais para o espaço do livro. O Livro-Padrão (1981), de Robert Filliou, é uma obra que também aponta para um novo começo da história: é pequeno e sanfonado, quando aberto transforma-se numa fita capaz de medir objetivamente toda literatura e avaliá-la conforme descrito pelo artista em tons cientificistas.
Estão presentes, ainda, livros de artistas como Jaider Esbell, Ulises Carrión, Wlademir Dias-Pino, Clemente Padín, Ulises Carrión, Sol Lewitt, Regina Silveira, Cinthia Marcelle e Cristiano Lenhardt.
Livro de carne
O espaço foi inspirado no conceito do Livro de carne (1979), de Artur Barrio, que tem as páginas como desdobramento sensorial e está na exposição. Neste contexto, o vínculo entre o sensível e o político, indicado no texto e proposto pela obra, é o que inspira o conjunto de trabalhos desse núcleo. São livros e publicações de artista que esperam a contiguidade no corpo, que estabelecem uma relação orgânica com o leitor, livros cujas páginas prolongam a pele e os sentidos, que dispõem do corpo para o contato com o mundo.
Desta forma, estão reunidas as revistas editadas pelo coletivo feminista Guerrilla Girls, que reescreve a história da arte nesse suporte acessível e direto; os livros com desenhos de León Ferrari, mapeamentos de fluxos humanos caóticos; os livros de Cildo Meireles e Erwin Wurm, que reduzem o conteúdo das páginas a imagens; a partitura de Dick Higgins, em que o corpo é energia implícita; os livros de Antonio Dias e Christian Boltanski, capazes de humanizar e recuperar a aura de imagens de arquivo. As páginas rasgadas de Anna Maria Maiolino também reivindicam marcas e índices de um corpo oprimido pela ditadura militar, como o livro de Barrio.
Vera Chaves Barcellos também está presente com a performance Momento Vital, de 1979. Para além do registro de performances, os artistas Marina Abramovic & Ulay, Vito Acconci e Gilbert & George se valem da natureza sequencial do livro para ocupar o espaço da página com ações corporais narrativas.
No vazio do mundo
Uma homenagem à Mira Schendel (1919-1988), autora de No vazio do mundo (1964) e artista que investigou com profundidade as consistências dos signos verbais e que tem obra de mesmo nome. Os trabalhos apresentados aqui investem na linguagem e não na imagem, como Os mil primeiros números classificados por ordem alfabética (1989), de Claude Closky, no qual transcreve por extenso os números de um a mil e os reorganiza em ordem alfabética, este trânsito entre sistemas de signos produz um resultado que é tanto lógico quanto inoperante na realidade. O número “cem” fica em primeira posição e o “zero” em última.
Esta parte ainda conta com obras de Ben Vautier, Lawrence Weiner, Sophie Calle, Douglas Huebler, Jenny Holze, Marilá Dardot Fabio Morais, Dick Higgins e Rute Gusmão, André Vargas, Armando Queiroz, Bijari, Daniel Santiago, Emilia Prieto, Grupo EmpreZa, Kurt Klagsbrunn, Paulo Bruscky, Paulo Nazareth, Pierre Verger e Wilson Piran.
A mostra também lança olhar às publicações que não são, rigorosamente, livros de artista, como os Cadernos Huni-Kuin, nos quais os pajés do povo Kaxinawá do Rio Jordão registram em desenhos coloridos conhecimentos ancestrais a respeito de plantas medicinais, mobilizando imagens e textos em seu idioma. Utilizam recursos com a linguagem que os aproximam tanto de botânicos quanto de artistas e poetas.
Algo parecido se reconhece na Literatura de Cordel, com processos editoriais, cumplicidade com a xilogravura, meios de criação e apropriação próprios. Ainda que prevejam circuitos locais para sua circulação, tais manifestações encontram no livro e na página o espaço de veiculação artística.
MUSEU DE ARTE DO RIO
O MAR é um museu da Prefeitura do Rio e a sua concepção é fruto de uma parceria entre a Secretaria Municipal de Cultura e a Fundação Roberto Marinho. Em janeiro de 2021, o Museu de Arte do Rio passou a ser gerido pela Organização de Estados Ibero-americanos (OEI) que, em cooperação com a Secretaria Municipal de Cultura, tem apoiado as programações expositivas e educativas do MAR por meio da realização de um conjunto amplo de atividades. A OEI é um organismo internacional de cooperação que tem na cultura, na educação e na ciência os seus mandatos institucionais.
“O Museu de Arte do Rio, para a OEI, representa um espaço de fortalecimento do acesso à cultura, ao ensino e à pluralidade intimamente relacionado com o território ao qual está inserido. Além de contribuir para a formação nas artes e na educação, tendo no Rio de Janeiro, com sua história e suas expressões, a matéria-prima para o nosso trabalho”, comenta Leonardo Barchini, Diretor e Chefe da Representação da OEI no Brasil. Após o início das atividades em 2021, a OEI e o Instituto Odeon celebraram a parceria com o intuito de fortalecer as ações desenvolvidas no museu, conjugando esforços e revigorando o impacto cultural e educativo do MAR, a partir de quando o instituto Odeon passa a auxiliar na correalização da programação.
O MAR tem o Instituto Cultural Vale como mantenedor, a Equinor, o Itaú Unibanco e a Globo como patrocinadores master, e a Nadir Figueiredo como patrocinadora. São os parceiros de mídia do MAR: a Globo e o Canal Curta.
A Machado Meyer Advogados e a Icatu, via Lei Federal de Incentivo à Cultura, também apoiam o MAR.
O MAR conta ainda com o apoio da Prefeitura do Rio de Janeiro, do Governo do Estado do Rio de Janeiro, do Ministério da Cultura e do Governo Federal do Brasil, também via Lei Federal de Incentivo à Cultura.
SERVIÇO:
Narrativas em Processo: Livros de Artista na Coleção Itaú Cultural
Coquetel de abertura: dia 28 de outubro (sábado)
Abertura da exposição: às 11h, com fala dos curadores
Em cartaz: de 28 de outubro de 2023 a 21 de janeiro de 2024
Local: Museu de Arte do Rio – MAR
Endereço: Praça Mauá, 5, Centro
Sala: 2º andar
Horário de funcionamento:
De Terça-feira a domingo
Venda de Ingresso na bilheteria e/ou totens: 10h30 às 17h
Visitação ao pavilhão de exposições: 11h às 18h (última entrada às 17h)
Valor do Ingresso Inteira: R$ 20,00; Meia-entrada: R$ 10,00
Formas de pagamento: Cartões de crédito ou débito.
Informações de gratuidade:
https://museudeartedorio.org.br/visite/horarios-e-ingresso/