‘Elvis’ reconta bem a vida do Rei do Rock de forma arrebatadora e espalhafatosa
A vida e a carreira de Elvis Presley já foram mostradas em filmes e programas de TV, a ponto de praticamente se esgotar o assunto. Então, o que “Elvis”, com estreia nesta quinta-feira (14) no Brasil, poderia oferecer de novo aos que conhecem bem a história do cantor?
Resposta: um filme disposto a mostrar a relevância da obra de Elvis e como isso ainda pode ser visto como inspiração de outros ritmos e artistas que vieram após sua morte, em 1977. Esse foi um dos acertos do longa dirigido por Baz Luhrmann (de “Moulin Rouge”, “O Grande Gatsby” e “Romeu e Julieta”). Ele mostra a trajetória do Rei do Rock com brilho e muita energia.
Narrada a partir do ponto de vista do Coronel Tom Parker (Tom Hanks), a trama mostra como ele conheceu o jovem Elvis Presley (Austin Butler, de “Era uma vez… Em Hollywood”), quando estava começando a se apresentar em feiras pelo interior americano.
Logo, o empresário decide comandar a carreira do cantor, que se torna uma estrela do rock, conquistando fãs com sua voz e suas performances incendiárias no palco, para o desespero dos moralistas.
O filme traça um paralelo entre a ascensão de Elvis e os eventos históricos e culturais que ocorrem nas décadas de 1950, 1960 e 1970. O Coronel Parker insistia em colocá-lo sempre desvinculado do que estava acontecendo, para continuar faturando com o público americano conservador.
O longa mostra seu envolvimento com seus pais, sua esposa, Priscilla Presley (Olivia DeJonge), além dos problemas com sua saúde e com as drogas, que vão deteriorando seu corpo e sua mente.
Divino e profano
O estilo operístico e espalhafatoso de “Elvis” talvez não caísse bem nas mãos de outro diretor. Mas o jeito de Baz Luhrmann contar suas histórias, de maneira enérgica e às vezes exagerada, casa perfeitamente para criar sequências arrebatadoras, especialmente nas apresentações musicais do filme.
Um bom exemplo está na sequência que traça um paralelo entre os shows que Elvis leva seus fãs ao delírio e os elementos que o inspiraram a cantar, ainda na infância. O diretor, de forma eficaz, mostra que, quando criança, Elvis ficava numa espécie de encruzilhada, em que se interessava em ouvir músicos de blues e jazz numa boate, ao mesmo tempo em que se sentia atraído pelos cultos religiosos, entre o divino e o profano. O resultado é mais do que satisfatório.
Outra boa sacada do filme é a mistura das músicas de Elvis a de cantores negros da época como Willie Mae “Big Mama” Thornton, B.B. King, Little Richard, entre outros e como suas obras não só inspiravam o ídolo como também a artistas de estilos mais contemporâneos como rap e o hip hop.
A mixagem de som, com gravações antigas e novas, é muito bem realizada e injeta uma criatividade para transmitir a mensagem que, mesmo tantos anos depois, Elvis e outros artistas de sua época ainda são importantes para a música que é ouvida nos dias de hoje.
Vale destacar também a ótima recriação de época, especialmente na direção de arte e nos figurinos, setores em que a equipe de Luhrmann sempre se destacou em produções anteriores.
Os momentos mais marcantes estão nas sequências que se passam em Las Vegas, quando Elvis passa a se apresentar por anos, já na fase final de sua carreira. As cenas dos shows dessa etapa, aliás, são bem impactantes.
It’s not only Rock n’ Roll…
É claro que “Elvis” não é um filme perfeito e conta com falhas que, se não chegam a prejudicar seriamente o longa, o faz perder pontos.
O ritmo é irregular: partes da história passam rápido demais. A relação de Elvis com a mãe, Gladys (Helen Thomson) e o pai, Vernon (Richard Roxburgh ), é pouco aprofundada, assim como a carreira do cantor no cinema.
Já outras, como o início de seu declínio se arrastam além do necessário, inflando ainda mais a duração do filme, o que pode cansar um certo cansaço do público.
Outro problema está no roteiro escrito a oito mãos (duas delas do próprio diretor), que se vale de várias situações que realmente não aconteceram, como a cena em que o Coronel Parker convence Elvis a ser seu empresário após uma volta numa roda gigante ou a de uma briga em cima do palco de um show em Las Vegas.
Além disso, o roteiro busca reforçar o fato de que o cantor sempre foi uma pessoa ingênua demais, o que não foi verdade. Mesmo com essas derrapadas, a história da vida de Elvis mantém o interesse do espectador.
O Rei e o Coronel
Mas o que fica na memória ao final de “Elvis”, além dos números musicais, são as incríveis atuações do elenco, em especial de Austin Butler e Tom Hanks.
O ator vencedor de dois Oscars (por “Filadélfia” e “Forrest Gump”), disposto a mostrar que não é só capaz de convencer como um bom moço, mergulha de cabeça na vilania do Coronel Tom Parker, tornando-o um personagem manipulador e odioso, que se vale da ganância para explorar Elvis de todas as formas, deixando-o sob seu controle de forma incondicional.
Apesar da fraca maquiagem para deixá-lo obeso, Hanks tira de letra o desafio de fazer seu primeiro grande vilão no cinema, tornando-se um dos pontos mais positivos do filme.
Mas quem realmente arrebata o público de forma exemplar é o próprio Elvis. Ou melhor, Austin Butler. O jovem ator, ainda pouco conhecido dos cinéfilos em geral, convence em todas as fases do cantor mostradas no filme.
Embora no início sua caracterização cause uma certa estranheza, aos poucos, Butler, assim como Kristen Stewart em “Spencer”, vai acertando cada vez mais o tom a ponto de o espectador deixar de ver o ator e enxergar verdadeiro Elvis em cena.
Além disso, ele canta algumas das canções do biografado de forma bastante convincente. Ele provavelmente deve ser lembrado na temporada de premiações na categoria de Melhor Ator e isso não seria nenhuma injustiça.
“Elvis” pode não ser a cinebiografia definitiva sobre o Rei do Rock. Mas empolga o suficiente para cativar antigas e novas gerações de admiradores da música e da mística do cantor.
A trilha sonora poderosa, além de hits de Elvis, conta com artistas como Doja Cat, Måneskin, Eminem, CeeLo Green, entre outros.
No final, fica a certeza de que o dono de Graceland (famosa mansão do Elvis, em Memphis, sua cidade natal) ainda não perdeu sua majestade.