‘Série Rotas’: quadrilhas usam empresas de fachada e ‘laranjas’ para lavar dinheiro de tráfico de drogas e armas
A Série Rotas, do RJ2, mostrou nesta quinta-feira (7) como as quadrilhas de tráfico de drogas e armas têm usado instituições financeiras para lavar o dinheiro criminoso. Para o esquema, são usadas contas de laranjas e empresas de fachadas, que recebem os pagamentos por contas on-line.
De acordo com as investigações, eles usam bancos para fazer os pagamentos das armas e drogas que dominam as rotas do tráfico, como Bolívia e Paraguai. As investigações apontam até para especialização do esquema criminoso, com grupos voltados exclusivamente para a lavagem do dinheiro.
O esquema pode acontecer por meio da venda de imóveis, carros ou empresas de fachadas.
Em uma ação, a Polícia Civil identificou 29 imóveis em nome de laranjas. Uma outra investigação aponta que um frigorífico era usado para lavar dinheiro do tráfico.
O primeiro passado, segundo a investigação, é a cooptação de pessoas que aceitem usar as próprias contas para lavar o dinheiro. Em seguida, o dinheiro passa por uma, duas, três ou até mais contas bancárias. São pessoas que emprestam seus nomes e documentos para os depósitos.
Depois, o dinheiro entra em empresas de fachada.
Procurada, a Federação Brasileira de Bancos disse que os bancos adotam rígidas medidas de controle e monitoramento de transações financeiras, seguindo as legislações normativos e boas práticas nacionais e internacionais. Além de trabalhar em parceria com os órgãos de prevenção e combate a crimes financeiros.
A Febraban ressaltou que os bancos brasileiros têm papel fundamental no sistema de prevenção a fraude e lavagem de dinheiro, mas não têm poder de polícia e, portanto, não são responsáveis pelo combate direto aos criminosos.
A Febraban disse ainda que diversas investigações das polícias Federal e Civil e do Ministério Público tiveram origem nas comunicações de operações suspeitas que os bancos encaminharam ao Coaf a partir do monitoramento e comunicação de operações suspeitas.
Segundo a Federação, para cada porta que os bancos fecham quando identificam uma nova tipologia, os criminosos buscam novas formas de inserir o dinheiro no mercado formal.
Preferência pelo mar
Quadrilhas de tráfico internacional de drogas têm usado portos do Rio de Janeiro para levar drogas da América do Sul para outros continentes, como mostra o segundo episódio da série Rotas.
O transporte de drogas e armas tem origem em diferentes estados, e os caminhos para entrar na cidade do Rio são muitos. De acordo com os investigadores, atualmente são 3 rotas principais usadas por criminosos:
A mais utilizada, segundo os investigadores, fica no Sul do país. A origem é o Paraguai, em regiões de fronteira com Paraná e o Mato Grosso do Sul. Por ali os traficantes enviam cocaína e fuzis. Ao entrar no Brasil, a droga segue até chegar ao Rio.
Uma segunda rota sai da tríplice fronteira, entre Brasil, Peru e Colômbia, passando pelo Rio Solimões, segue pela região central do Amazonas, Tabatinga, Manaus até entrar na região Sudeste e chegar ao Rio. A polícia diz que os bandidos utilizam esse caminho para transportar principalmente cocaína e skank. Armas também são enviadas por ali, principalmente o fuzil AK47. O trajeto mostra a aliança entre duas facções criminosas: o Comando Vermelho do Rio de Janeiro e Comando Vermelho do Amazonas.
A terceira rota sai do Mato Grosso, na fronteira com a Bolívia, passa por São Paulo até chegar no Rio. Nesse caso, o Comando Vermelho do Rio age com o PCC. Cocaína, maconha e fuzis são transportados por meio desse caminho.
Uma vez no Rio, o passo seguinte é levar a droga a dois principais pontos de saída: os portos do Rio, no Centro da cidade, e o de Itaguaí, na Região Metropolitana. A ideia dos criminosos é levar, principalmente, para os continentes europeu e africano.
Até outubro deste ano, o Porto do Rio movimentou mais de R$ 8 bilhões em mercadorias, segundo a Receita Federal. O grande volume de exportação é um atrativo para os criminosos.
“Se você pega um modal aéreo, você consegue transportar de 20 a 30 quilos em uma mala, mas no modal marítimo já tivemos apreensões de 5 toneladas de cocaína”, explica o delegado da Polícia Federal Bruno Humelindo de Oliveira.
Todas as cargas passam por um scanner e, todos os dias, os fiscais recebem um relatório com a carga que apresentou algum tipo de inconsistência na imagem. Mas, ainda assim, os criminosos tentam burlar.
“Eles usam cargas que de alguma forma vão dificultar a identificação do scanner, como sal, café, porque o cheiro fica diferente. O café é uma mercadoria muito usada porque tende a dificultar a identificação por parte dos cachorros. Nossa maior apreensão recentemente foi de 5 toneladas em uma carga de sabão em pó”, explica
O Porto de Itaguaí conta com 12 terminais, que vão da cidade de Itaguaí até Angra dos Reis. É o terceiro maior porto público do Brasil. Como se a fiscalização contra as drogas não fossem um desafio, lá os agentes ainda lidam com outro problema: a violência no entorno.
Itaguaí está entre as 20 cidades mais violentas do país, segundo o Ipea.
Há a suspeita de que mergulhadores profissionais estão colocando as drogas nos navios em alto-mar.
Tentativas de driblar fiscalização
Criminosos que contrabandeiam armas e drogas para o Rio de Janeiro têm investido em novas estratégias para burlar a fiscalização. Bandidos estão investindo em tecnologia para colocar os itens ilegais de forma cada vez mais escondida em bens como veículos e até brinquedos. Além disso, formou-se uma espécie de consórcio em que diferentes facções compartilham parte da logística.
Outro caso descoberto pela polícia foi um compartimento dentro de um carro que só era aberto com um cartão magnético — dentro, havia drogas, armas e dinheiro do mercado ilícito.
O delegado da Polícia Federal Bruno Humelindo de Oliveira conta que muitas vezes após chegar a capitais como o Rio, os itens ilícitos são armazenados para serem enviados ao exterior.
“As organizações criminosas começaram a se especializar. Em vez de eu ter uma organização criminosa voltada exclusivamente para todo esse caminho, cada organização criminosa é responsável por uma fração desse trajeto. Então eu tenho uma organização criminosa que consegue a droga na origem; outra que consegue trazer da origem até a fronteira, e aí eu tenho uma pessoa que fornece um serviço legal da droga da fronteira até a capital. Aqui a gente tem a principal facção criminosa do Rio de Janeiro fazendo armazenamento dessa droga e fazendo a oportunidade de escara essa droga para o exterior”, explica.
Aeroporto
As drogas e armas também chegam ao Rio de Janeiro por outro caminho. Só no primeiro semestre deste ano, a Receita Federal apreendeu o equivalente a mais de R$ 740 mil em drogas nas bagagens de passageiros.
“Tem algumas rotas que são mais utilizadas pelos traficantes de drogas e armas. É um jogo de gato e rato, quando começamos a fazer mais apreensões em uma rota, eles mudam, desde voos diretos até conexões. Temos que ficar alterando, fazendo fiscalização dinâmica”, diz Paulo Angelito, auditor da Receita.
Outro local é ainda mais sensível: o armazem dos Correios no Aeroporto do Galeão. Todas as remessas internacionais passam por lá. Segundo a Receita, cada vez mais os criminosos tentam enivar armas através dos Correios para o Rio.
A maior parte das peças apreendidas têm origem em dois países: Estados Unidos e Alemanha.